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Como cheguei a Araxá guiando o Renault R8 da primeira vitória de Fittipaldi

Rodrigo Mora

07/09/2018 17h47

(ARAXÁ) – "A segunda é meio chata, difícil de entrar. Tem que trazer bem pra esquerda pra engatar. E fica de olho na pressão do óleo", orienta Maurício Marx ao me passar o volante do seu Renault R8 Gordini.

Estamos indo de São Paulo a Araxá, pitoresca cidade mineira que nesse feriado da Independência recebe a 23ª edição Brazil Classics Renault Show, o encontro de automóveis antigos mais cobiçado do País e o que mais se aproxima dos eventos internacionais, como Pebble Beach e Amelia Island, entre outros.

Me ajeito no pequeno banco do tipo concha e ajusto o único retrovisor a que tenho acesso, o interno, já que o externo esquerdo é fixado no para-lama e o direito não existe.

Engato primeira, solto a leve embreagem e pressiono o acelerador de pedal pivotado no assoalho. Marx tinha razão quanto à teimosa segunda. Desisto dela e já pulo pra terceira, que entra fácil, como a quarta.

Duvido que a tal segunda marcha tenha complicado a vida de Emerson Fittipaldi em 7 de novembro de 1965, quando conquistou sua primeira vitória na carreira ao vencer a 4a etapa do Campeonato Carioca de Automobilismo, na Ilha do Fundão (RJ), com esse mesmo Renault R8 Gordini que agora me levava para o evento de Araxá.

Fittipaldi tinha 19 anos – completaria 20 dali a pouco mais de um mês – e corria pela equipe Willys, um dos embriões do automobilismo brasileiro. Dela saíram os primeiros brasileiros na Fórmula 1: além de Emerson, seu irmão Wilson e José Carlos Pace.

Emerson ao volante do Gordini em sua primeira vitória, em 7 de novembro de 1965

A parceria não durou muito, contudo. Emerson Fittipaldi foi para os monopostos da Fórmula Vê (construídos por seu irmão Wilson), depois passou por Fórmula Ford e Fórmula 3, até chegar à Fórmula 1, em 1970. Campeão do mundo em 1972 e 1974, virou estrela internacional.

Quanto ao Renault R8 Gordini, sua carreira foi mais curta e modesta. Correu até 1967, se aposentou, virou carro de rua, foi restaurado e em meados do ano passado chegou às mãos de Marx, restaurador e colecionador paulista.

"Quando comprei o carro, ele estava pintado num azul claro típico dos Gordini de corrida franceses. Depois descobri que ele era o carro do Emerson, daí resolvi deixa-lo exatamente como era nos seus tempos de competição", conta Marx. Nascido em 1962, o R8 foi o sucessor do Dauphine e durou até 1973. O sobrenome Gordini designa sua versão mais apimentada, uma homenagem a Amedeo "Amédée" Gordin, um italiano que se tornou um famoso preparador de motores Renault.

Maurício Marx voltando o R8 na cor da equipe Willys

Emerson e o R8 Gordini se reencontraram no começo do ano. É que o piloto foi o grande homenageado do Amelia Island Concours d'Elegance – concurso de automóveis clássicos realizado nos EUA –, onde os caras tiveram a ideia de reunir os principais carros de corrida guiados por Emmo, seu apelido em terras ianques, como a Lotus de 1970, a McLaren de 1974 e os Penskes de 1989, 1993 e 1994 da Fórmula Indy, cujo campeonato de 1989 foi vencido por ele.

Já a minha relação com o pequeno Renault foi melhorando com o tempo. Tive que entender que não seria nessa encarnação que eu conseguiria engatar a maldita segunda, e tudo bem. Fui curtindo outras coisas que me apetecem num carro, como a direção leve e de respostas diretas, a traseira agarrada ao chão e o berro do motor – que ainda mantém todas as peças dos tempos de competição exceto pelo bloco, hoje um 1.4 derivado de um Escort – antes de torcer o nariz, lembre-se de que motor CHT que equipou os Ford do fim dos anos 60 é um projeto da…Renault!

Parada para abastecer

No mais, muita coisa original foi mantida daqueles tempos de disputas. Como o para-brisa, que ainda carrega as marcas do tempo. Outras surgiram recentemente, como o autógrafo de Emerson no capô. Você ali, esperando pra converter à esquerda, e aquela assinatura desviando seu olhar e levando a imaginação pra longe.

Enfim, chegamos ao encontro. Descubro que muitos colecionadores despacharam seus carros em plataformas, enquanto outros foram guiando seus clássicos. E como eu cheguei? Dirigindo nada menos do que o carro da primeira vitória daquele que mais tarde viria a ser bicampeão de Fórmula 1, bicampeão das 500 Milhas de Indianápolis e campeão da Indy.

No pátio do hotel, procurando a vaga destinada ao R8, tento uma reconciliação com a segunda marcha. E não é que ela entrou?

 

Viagem a convite da Renault.

 

 

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Sobre o autor

Rodrigo não Mora apenas nos Clássicos. Em sua trajetória no jornalismo automotivo, já passou por Auto+, iG, G1, Folha de S. Paulo e A Tarde - sempre em busca do que os carros têm a dizer. Hoje, reúne todos - clássicos e novos - nas páginas das revistas Carbono UOMO e Ahead Mag e no seu Instagram, @moranoscarros.

Sobre o blog

O blog Mora nos Clássicos contará as grandes histórias sobre as pessoas e os carros do universo antigo mobilista. Nesse percurso, visitará museus, eventos e encontros de automóveis antigos - com um pouco de sorte, dirigirá alguns deles também.