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Mora nos Clássicos

Clássico elétrico se equilibra entre heresia e solução para o futuro

Rodrigo Mora

21/03/2018 06h00

911 elétrico da Voitures Extravert

Recentemente, uma empresa alemã decidiu remover o motor boxer de Porsches 911 dos anos 70 e 80 e no lugar espetou um propulsor elétrico. Abastecido por baterias que somam 60 kilowatts, o substituto leva o esportivo aos 100 km/h em 6 segundos e lhe garante 400 km de autonomia. Nada mau.

Segundo a Voitures Extravert, o projeto Quintessenza ainda melhora a dinâmica já testada e aprovada do 911, já que as baterias são montadas na frente e atrás, distribuindo melhor o peso entre os eixos. Por fim, deixa o 911 com o aspecto do modelo dos anos 1960. Ter um desses custa US$ 370 mil (R$ 1,2 milhão).

Claro que a Voitures Extravert não é a única nesse mercado ainda ínfimo. No portfólio da inglesa Electric Classic Cars, tem Fiat 500, VW Fusca e também Porsche 911 que trocaram o balé dos pistões pelo zunido da corrente elétrica. "A maioria dos nossos carros acabam com o dobro de potência dos seus motores originais", se gabam. Com eles, você pode tanto converter seu clássico, quanto escolher um modelo e deixar que façam o resto.

Baseada na California, a Zelectric Motors parece ter se especializado em Fuscas e Kombis, enquanto a Electric GT já mudou o sexo de uma Ferrari 308 GTS (que depois do transplante virou GTE).

Até a Jaguar experimentou fazer um E-Type eletrificado. Ainda não está à venda, pois a empresa só iniciará a produção se houver determinado quórum de compradores, que desembolsariam cerca de £ 300 mil, ou R$ 1,4 milhão.

Baterias vão sob o porta-malas do E-Type Zero

Exemplos não faltam, portanto.

Será esse o futuro do carro antigo? A única maneira de poder sair de casa sem correr o risco de apanhar de SUVs híbridos e elétricos numa esquina escura qualquer? Ou você eletrifica seu Corvette ou será um párea na sociedade de 2032?

A Electric Classic Cars diz que só há vantagens: "chega de fumaça preta e cheiro de gasolina. Apenas sente-se, relaxe e aproveite o passeio silencioso e confiável". Estou de acordo com o lance da fumaça preta, mas cheiro de gasolina, barulho e falta de confiança são a essência do que é ter e guiar um carro antigo, não? Quantas histórias ou amizades já não nasceram de um motor enguiçado?

E pode esquecer o fator investimento: eletrificados, esses veículos perdem o valor que teriam como item de coleção intocado.

Contudo, um clássico elétrico pode ser a saída para entusiastas se de fato o cerco fechar ainda mais para veículos a combustão. E pode se tornar um mercado atraente, também, ao convergir os interesses de um colecionador compromissado com as urgentes demandas do meio-ambiente. Sem contar que guiar um carro elétrico é um barato, e não deve deixar de ser no caso de automóveis clássicos.

No final do ano passado, entrevistei Patrick Rollet, presidente da FIVA (Fédération Internationale des Véhicules Anciens), entidade máxima do antigomobilismo em todo o mundo, que me acalmou: clássicos, elétricos e autônomos viverão em harmonia – afinal, os primeiros são reconhecidos pela Unesco como patrimônio histórico da humanidade desde 2016.

"A palavra certa é coexistência. Acho que vai funcionar. Creio que mesmo daqui a 50 anos haverá mercado para carros históricos, porque a paixão sempre estará lá, o sentimento de cultura de uma herança", disse ele.

Quando perguntei qual sua opinião sobre clássicos com motores elétricos, a cara do velhinho francês foi de desprezo total.

Sobre o autor

Rodrigo não Mora apenas nos Clássicos. Em sua trajetória no jornalismo automotivo, já passou por Auto+, iG, G1, Folha de S. Paulo e A Tarde - sempre em busca do que os carros têm a dizer. Hoje, reúne todos - clássicos e novos - nas páginas das revistas Carbono UOMO e Ahead Mag e no seu Instagram, @moranoscarros.

Sobre o blog

O blog Mora nos Clássicos contará as grandes histórias sobre as pessoas e os carros do universo antigo mobilista. Nesse percurso, visitará museus, eventos e encontros de automóveis antigos - com um pouco de sorte, dirigirá alguns deles também.