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Mora nos Clássicos

Por que Steve McQueen, morto em 1980, ainda supervaloriza seus carros?

Rodrigo Mora

27/10/2018 08h00

(SÃO PAULO) – No próximo dia 10, a Silverstone Auctions vai mandar pra leilão um Willys Jeep MB 1945, entregue ao exército norte-americano em 7 de julho daquele ano. Mas não é um jipe qualquer, e sim aquele que pertenceu a Steve McQueen, que o comprou (não se sabe ao certo quando) direto das forças armadas ianques.

McQueen ficou com o Willys até sua morte, em 7 de novembro de 1980.

Quatro anos depois, o jipe foi arrematado num leilão de bens do ator por US$ 6.000, dez vezes mais do que custava um Willys Jeep "comum". A restauração rigorosamente fiel às condições originais veio na sequencia, e inclui um certificado de pertencimento à coleção de McQueen e a placa de licenciamento da Califórnia (EUA), que expirou em 31 de outubro de 1980.

Nessa segunda participação em leilões, o Willys de McQueen deve ser arrematado por algum valor entre £ 80.000 e £ 100.000 (R$ 384.000 e R$ 480.000).

Claro que esse jipe não é o primeiro carro de McQuenn a ser supervalorizado.

Em agosto de 2011, o Porsche 911S que aparece nas primeiras cenas de Le Mans (1971) foi arrematado por US$ 1.375.000, em leilão da RM Sotheby's (VINTE vezes mais do que valia o modelo à época). Depois do filme, o esportivo foi direto para a coleção do ator, que já tinha um quase igual, só que 1969, um ano mais velho. Para não ficar com dois Porsches semelhantes, vendeu o do filme, que após passar por alguns proprietários, chegou às mãos da casa de leilões.

Do mesmo filme saiu o Porsche 917K que a Gooding & Company vendeu no ano passado por US$ 14 milhões. E esse sequer foi de McQueen. Sua trajetória começa nos testes para as 24 Horas de Le Mans de 1970, e embora tenha batido o recorde da pista, não participou da corrida. Foi logo em seguida comprado por Jo Siffert, ex-piloto de Fórmula 1 vítima de uma acidente fatal no circuito inglês de Brands Hatch, em 1971 – pouco depois de ter emprestado seu carro de corrida aos produtores do filme. Após a filmagem, o 917K sumiu, reaparecendo apenas em 2001, em Paris.

Outro carro que também jamais pertenceu ao ator, mas só por ter um elo com McQueen virou lenda é o Ford Mustang de Bullitt (1968). Dois Mustangs, especificamente: um utilizado nas cenas de perseguição do detetive Frank Bullitt, que saiu detonado do filme; e outro reservado às demais cenas, fotos e ações publicitárias. Nenhum foi a leilão (por enquanto), mas são duas peças cobiçadíssimas no mundo do antigomobilismo.

Ainda teve a Ferrari 275 GTB/4 1967 arrematada US$ 10,1 milhões (em agosto de 2014), o macacão usado em Le Mans (vendido por US$ 984.000, em 2011), além de motos, relógios…tudo o que foi tocado, usado ou que pertenceu a Steve McQueen parece ganhar uma áurea sobrenatural.

É como se, ao obter um carro, um relógio ou qualquer item relacionado ao astro, o novo dono tomasse um elixir que o levasse a dirigir como McQueen, andar como McQueen, falar como McQueen, seduzir como McQueen, ser rebelde como McQueen.

E o que faz de Steve McQueen o "King of Cool"? Ou melhor: por que ele ainda é um ícone cultural mesmo não estando por aqui há 38 anos?

Algumas de suas frases ajudam a entender. "Certamente não sou quem as pessoas pensam que sou. Eu sempre faço o que quero fazer, e meus filmes são algo pessoal para mim", disse certa vez. "Eu vivo para mim e não obedeço a ninguém", declarou em outra ocasião.

Parece marketing pessoal? Bom, na lista de filmes recusados por McQueen estão Butch Cassidy and the Sundance Kid, Apocalypse Now e Dirty Harry, que pro ator talvez não fizessem sentido. Não queria filma-los, não filmou – às favas com o milionário cachê.

Na infância, foi abandonado pelo pai, criado pelos avós e apanhou dos padrastos. Passou por um reformatório e integrou a marinha norte-americana, mas sua insubordinação orgânica era incompatível com o rigor militar. Depois virou ator. E, quem diria, disputou 19 corridas, em diversas categorias, entre 1959 a 1970. Foi o ator mais bem pago do mundo em meados de 1975, e chegou a ter 100 carros e motos em sua coleção.

A vida de McQueen não dá para comprar. Mas grande parte do que foi dele, sim – nem que custe muito mais.

Macacão de McQueen usado em Le Mans custou quase US$ 1 milhão

Sobre o autor

Rodrigo não Mora apenas nos Clássicos. Em sua trajetória no jornalismo automotivo, já passou por Auto+, iG, G1, Folha de S. Paulo e A Tarde - sempre em busca do que os carros têm a dizer. Hoje, reúne todos - clássicos e novos - nas páginas das revistas Carbono UOMO e Ahead Mag e no seu Instagram, @moranoscarros.

Sobre o blog

O blog Mora nos Clássicos contará as grandes histórias sobre as pessoas e os carros do universo antigo mobilista. Nesse percurso, visitará museus, eventos e encontros de automóveis antigos - com um pouco de sorte, dirigirá alguns deles também.